...

 

A exaustão me fez conformar com o monótono dia-a-dia. Aceitei essa decrepitude , não sei até quando. A raiva floresce quase todas as manhãs, desabrocha em tédio e pelo noite, some.

A ânsia de vômito não voltou mais e não mais empalideci. Tudo parece tão insípido, mas tão pouco exasperador que essa quietude quase pode ser chamada felicidade.

Não tenho mais pensado nisso com tanta frequência, mas acho que há dias em que não me importo em viver mais um dia, outro dia monótono, mais uma chance para a raiva fluir e depois desaparecer.

Ausência

O sangue escorre para fora como suor até restar apenas o frio e a ausência que sou.

Estou inerte sob uma vastidão de luzes fracas. A multidão passa incessantemente e minha voz falha.

Dias que se acumulam e emaranham descoordenadamente, sem propósito, apenas existindo em caos dissonante.

O canto agudo ao longe ressoa com a quieta agitação interna. O estardalhaço dos pássaros ao entardecer soa como um mau agouro. Tento decidir se é algo realmente indesejado.

O aroma azedo da inalterabilidade impregna e nauseia. A escuridão desce em incerta calmaria. O dia levanta outra vez em escuridão.

Trechos fragmentados


28/11/2020

Eu não pertenço àquele lugar, não pertenço a este lugar, não pertenço a lugar nem um. As nuvens se acinzentam tristes em preparação a uma tempestade que nunca chega. Me conformo com essa sensação amarga e esses ventos que não cessam se tornaram testemunhas da casca que me tornei.


14/12/2020

Meu riso é o fôlego de quem está se afogando pra submergir outra vez.


16/06/2021

Não tem nada pra mim na silenciosa escuridão noturna, não tem nada para mim em lugar algum.

Quero continuar de olhos abertos enquanto não puder mais. Tenho medo de ficar sozinho no escuro, tenho medo que esse meu pequeno mundo estático pare de vez e me separar subitamente em um lugar estranho.

Eu quero acabar, mas quero permanecer.



Gaiola

A gaiola está fechada e eu não enxergo as grades. O vento e o seu frio incomodam, mas não tenho para onde ir. Estão todos lá fora voando e eu aqui me perguntando se saberia voar como eles. Será que gostam de voar? E suas asas, será que não fatigam?

Não recordo desde quando estou nesta gaiola. Talvez tenha nascido aqui ou talvez tenha entrado sem perceber. Às vezes é confortável, mas quando olho em redor sinto medo, todo tipo de medo, e volto a me encolher no canto.

A gaiola está fechada? Não sei ao certo, não enxergo. Não posso dizer muita coisa sem ver suas grades e onde estão, por isso permanecerei aqui até quem sabe algo descobrir.


Khaos

Eu preciso encontrar uma saída, mas alguma parte em mim não anseia o mesmo. Tudo o que eu sinto é vazio, tudo que eu respiro é vazio. Nada faz sentido e isso me corrói, mas eu continuo aqui. Mesmo assim há algo dentro que se apraz com essa sensação e eu continuo aqui, dia após dia, morrendo sem morrer, existindo por existir.

Sem pertencer a lugar nem um eu sigo sem sentir um chão sob meus pés, sem saber sequer se um dia haverá algum à frente. Avanço sem razão.

Há dias em que é possível sorrir sem mentir, mas isso não muda o vazio. Eu preferiria ser ferido constantemente, semana após semana, talvez assim eu pudesse ter algo para sentir. 

Uma amálgama de sentimentos se desbota até não ser mais nada. Eles continuam lá, talvez, perdidos no escuro, indistintos, fazendo parte de mim e me corroendo até eu não os perceber mais.

Eu ainda quero encontrar uma saída, seja ela qual for, mas ainda não tenho força ou coragem. Eu preciso… mas eu ainda estou aqui.

recomeçar


Os dias passam pálidos e bobos, como uma resposta a mim mesmo. As horas, distraídas, e enfim do dia o findar. O sol começa a baixar e as sombras se estender, trazendo junto o pesar.

Um frio se apodera de mim, porém sem trazer sua sensação térmica, apenas o incontrolável tremor. Um tremor que vem do mais profundo da minha mente, e nela, um grito desesperado e mudo rasga seu silêncio.

A cada bater do ponteiro um pouco da minha consciência se esvai, a visão enturvece, perdendo o resplendor de qualquer fagulha de riso. Os olhos mergulham num redemoinho interno de medo e murcham, como se longos dias insônitos se abatessem num instante sobre si.

Um estalido no portão e a indicação do ponteiro. É chegado o momento não esperado. Passos no corredor se debruçam como um manto de penumbra pela casa e meu coração salta. Eu, quieto em meu quarto acompanho cada som como com um mapa mental enquanto divago sobre o que está prestes a acontecer.

Como se já esperasse por esse momento, a porta se abre e diante de meus olhos se posta toda a representação dos meus medos. Um som intimidador estoura no ambiente, meu tremor se intensifica e as lágrimas se seguram na borda dos meus olhos, uma tentativa de manter a sanidade, elas escorrem de volta para dentro e o choro se derrama invisível a olhos alheios.

As palavras que ouvia ressoavam com minhas cobranças internas e preenchiam lacunas ainda não ocupadas pelos receios. Meus erros indesejados e automáticos, mesmo os mais simplórios eram expostos diante de mim, como se o simples fato de respirar viesse acompanhado de um crime imperdoável. Uma existência inútil e sem sentido, sem foco ou talento, perdida e completamente deslocada sentada aos prantos imaginários em sua cama a esperar a sombra e o som estremecedor passarem.

Largado destruído no vazio do pensamento, os minutos passavam como noites inteiras de tristeza, à procura de uma resposta para tantas tentativas de fuga da situação.

Após o silêncio do fechar das portas, meu ser tenta sua fuga, uma fuga de natureza desesperada, quieta e cabisbaixa, impensavelmente tateando em busca de uma fagulha de felicidade que anuviasse ou diluísse a névoa disposta nesse ambiente postado entre o físico e o ideário. Me cerco dos meus fingimentos, os fragmentos fugazes de felicidade e esqueço de tudo ao redor, o exterior problemático e caótico para mergulhar no meu momentaneamente acolhedor e íntimo caos.

Momentos de distração e fuga no fim da noite acompanhados de um desejo de que o manto da noite fosse contínuo para que aquela curta fuga não tivesse fim, contra toda a expectativa.
Por fim, a noite se fecha juntamente com meus olhos exaustos, contra meu desejo e a favor da necessidade para reabrir-se com a luz apática do recomeçar.

Distante

Me sinto morrendo internamente, sendo corroído pelo nada e pelo agitar de coisas que se assemelham a sentimentos. Um desespero contido lateja por trás de um sorriso opaco enquanto o marasmo me submerge em um mar amargo, escuro e calmo. 

Meus sonhos são delírios, anseios totalmente distantes dos meus pés. Sonhos para fugir da realidade ou a sobrepor. Perdido na infinitude de um mar indiferente, tudo me que apraz se liquefaz e insipidesse. Morrerei desidratado antes de alcançar a praia. 

Eu já não sou eu mesmo, sou o que restou de alguém, alguém que um dia sonhou e sorriu, mas se perdeu. Fugir da realidade já é quase tão natural quanto abrir e fechar os olhos, uma realidade que não parece ser real, um sonho desesperador do qual não sei acordar. Quem me acordará de mim?

Vil

Perdeu o brilho, a cor e a paz. Cada tentativa parece em vão. As palavras são as mesmas; o tempo passa e já não faz mais diferença se são segundos, meses, horas ou anos, ele apenas continua correndo em um quarto fechado.
Dia após dia apenas tento sobreviver a mim mesmo, perspectivamente desamparado. O ânimo agora sequer esvaece, os olhos já se abrem trazendo consigo uma respiração sem ar. O sol declina e volta e declina novamente e tudo está igual.
A noite traz um desespero, uma ânsia por preenchimento. A alma está com fome e os olhos se alimentam do vazio. Qualquer coisa já está bem. Não!
As lágrimas do âmago desmoronam em silêncio continuamente. É apenas tudo igual, tudo igual, tudo igual. Minha apatia não mais suporta a si, nem a mim.
A mente vacila e entre seus abismos minhas palavras caem, cessam, junto com minhas mãos.

Chuva

Agora chove
         As gotas escorrem
 Gotas de sentimentos
           Que caem
  E esvaem
E se dissolvem
                        Como chuva

                                                                 E F Ê M E R O

Se esvai
             E
Altera

O amargo desabrocha em doce
             Cai como pétala
                                                  É levada pelo vento

Como a chuva
Deixa uma marca
No peito

Vai
        E
Fica
 E Volta
Permanece e deixa voar.



     A chuva passou?

|||

No meio da multidão ela correu. Veio meio saltitando, os pés ligeiros, deslizava leve com o vento, desviando elegante da multidão. Ela veio com um sorriso distraído e insistente, como menina, os olhos alegres, o copo na mão.
Eu observando,
                         ela pousou diante de mim
    parou
as palavras
         .
         .
o que mudou?
     Nada, ainda nada;
As palavras continuam ocultas no ar.

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