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No meio da multidão ela correu. Veio meio saltitando, os pés ligeiros, deslizava leve com o vento, desviando elegante da multidão. Ela veio com um sorriso distraído e insistente, como menina, os olhos alegres, o copo na mão.
Eu observando,
                         ela pousou diante de mim
    parou
as palavras
         .
         .
o que mudou?
     Nada, ainda nada;
As palavras continuam ocultas no ar.

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Estranho, quase apático
eu passo
Me esvazio do vazio
e contemplo.
Passo sobre minha existência, pelo caminho perdido
através da dor introspecta
que respiro
e sinto.
E sobre a dor o confortante perdão. A sina de estar onde quero estar,

mesmo quando não quero.

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Procuro entender a forma e a letra, o sentido e a transcendência.
Desisto desistir. Ainda vergonha. Transpor a parede por mim imposta.
Voar, voltar. Transpor o que sou, reconstruir o que sou.
Contradizer minha contradição, fazer dela o meu eu.
Meu andar se busca. Firmar. A mim reafirma. De ti se esconde, tímido se (re) apresenta.

Passos ao alvorecer

Enquanto o silêncio de minhas palavras, busco um auxílio. A movimentação em redor não para e o barulho é enlouquecedor, mas nada ouço, meus olhos calados apenas observam.
Sozinho, interrompo o silêncio com minha voz e procuro. Retenho as palavras, retenho os olhares. Talvez não faça sentido, pode parecer sem propósito como um retalho de frases pela metade, mas é apenas o meu eu sincero.
O ciclo se refaz, a lucidez se reconstrói. O princípio é exasperante, logo após, me desfaço em um ânimo fugaz até avistar as flores da primavera e o sol de brilho diferente que penetra meus olhos. É então que olho ao redor e vejo tudo que foi dito e tudo que busquei como um quebra-cabeça quase completo.
Eu talvez descreva como silêncio, o silêncio da espera, o silêncio do olhar, da análise cuidadosa e demorada, o silêncio da mudança.
O ânimo explosivo e precipitado em calmaria, mas confesso, tudo se repete e a paciência se perde, se perde pelo desespero e pelos olhos. Digo que não quero, mas quero a serenidade e lucidez que sempre descubro à primavera, e sobresta não é metáfora.
Uma atitude se cobra. Um passo de cada. Olho para frente, olho para agora. Saber pôr um pé na frente do outro e respirar.
Falo, falo e logo calo. Deixo minhas palavras pela metade como se as engolisse subitamente, e ficam as perguntas nos olhares. O cuidado para não soprar promessas, para não jogar palavras ao vento. O que diria em público, agora em secreto, mas como um pedido, como um anelo de mudança, enquanto silêncio, à luz da fresta da janela.
Busco palavras amigas, ou apenas aliviar a garganta, mas ninguém encontro. Há momentos de solidão, há momentos de abandono, momentos de autodescoberta. Não. Não sozinho. Há alguém ao lado a espera de minha voz, lembrei agora, enquanto silêncio, à luz da fresta duma janela.
Lucidez. Havia esquecido tudo que foi dito e o que havia pedido.
E eis outros momentos no coração para avistar outros alvos, que se unem em outro tempo que não avisto. Propósitos que seguem sozinhos em um alvo comum, tornando-se um ao amanhecer.

Já parece não haver sentido, mas há em tudo que agora vejo embora não veja o fim, mas sigo olhando para o alvo, lembrando das palavras outrora lançadas, alcançar pela fé.

A outra dor

Vidas que vêm e que vão, meus olhos a observar mil dores a passar. Tão solitários passos, tão tristes olhares. Corações a buscar refúgio, querendo apenas ouvir um consolo. Âmagos tão secos buscando Água viva sem saber.
Tanto se diz só de ouvir, mas não se tenta sentir a dor. Palavras erradas lançadas como remédio sem prescrição. No consolo que buscaram só encontraram mais angústia e descaso.
Muitos que dizem se importar, preocupar, apenas a fingir. Eis a lançar palavras ao descaso matando quem só procurava o alívio para sua dor.
O orgulho de se sentir superior, sentir o ego aflorar apenas por alguém a sua ajuda pedir. Dessa forma a pisar corações que acreditavam na sua humildade. Uma vida desprezada sem atenção.
Descaso, o erro de lançar uma palavra gravada sem se preocupar com a dor do coração. Cada coração tem sua dor, cada coração é uma terra diferente, cada coração é um coração diferente. Palavra lançadas de qualquer forma e sem cuidado apenas ferem.

É preciso ter compaixão, é preciso chorar com os que choram, é preciso sentir em si a dor do outro para assim saber o que se passa, saber como curar a ferida, para com empatia lançar a Palavra de vida, para aliviar a dor, matar a sede e despertar uma nova vida.

Esvaecer


Sinto-me sujo. Estou caído à lama sem vontade de levantar. Os dias passam cada vez mais rápido, e eu já perdi a conta de quantas vezes pensei em condenação, e quantas foram as vezes que tentei evitar. Não quero continuar assim, mas ainda não tenho ânimo para me levantar. Na verdade, encontrei um lugar de conformidade à beira do precipício. Tenho medo de cair, mas fiquei conformado demais para me mover.

O tempo continua a passar, e eu já não me dou conta. De onde estou pude ver a falsidade de cada ato, que já faço sem pensar, de forma mecanizada. Estranha forma de perceber como estou lúcido de cada coisa que se passa em redor e de cada ato meu, mas isso não ajuda em nada.

Estou em um lugar diferente do que costumo estar. Estou me observando de forma analítica e estúpida, cada vez mais sinto mais nojo! Não sei onde foi parar tudo que um dia me moveu. Já tentei reencontrar minhas forças, me arrependi e tentei recomeçar, mas me decepciono cada vez mais comigo. Espero poder voltar, mas sinto que eu não me permito.

Tentei manter ao menos minha integridade, mas minha mente pensa coisas vãs quase de forma inconsciente, e o torpe já é mais frequente. Meu coração se entristece com isso e eu vou ficando cada vez mais apático a tudo.

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Tento não abrir mais os lábios, eles me lembram de que estou sujo demais para orar. Pode parecer um pensamento errôneo, mas não consigo evitar.

Posso ver cada um dos meus erros nitidamente, é quase como se eles me acusassem.

Preciso voltar!

Minha mente tenta me enganar me confundindo. Quero tomar alguma atitude, mas preciso que seja realmente sincera.

hate

Repentinamente começaram a cair sobre minha pele gotas de doces sentimentos, suavemente, se espalhando como uma calma chuva sobre mim. Lembranças amargas foram se dissolvendo, o ressentimento e o desespero fincados na memória foram sendo lavados, levados por essa jovem e dócil chuva que me toma como um olhar de ternura.
Posso ouvir um coração a bater, suave e calorosamente, apagando o nosso passado a cada pulsar. E meus erros pouco a pouco se vão murchando, e um sorriso toma o lugar.
laços reentrelaçando
Talvez não seja um sentimento antigo a ressurgir, mas um novo que nunca teve a chance de envelhecer. Ainda jovem foi trancado e impedido de se estabilizar e amadurecer. Agora, depois de tanto, pôde novamente respirar. Antes asfixiado pela imaturidade de um coração impulsivo, enfim teve a oportunidade de se libertar.
Olhamos um para o outro e já não vimos a névoa que pairava entre nós. Pudemos então ver nossos sorrisos e também nossos olhares perplexos, um tanto desajustados.

A fenda infinda

O quer é apenas birra de uma criança fingida, que finge ser gente grande, para fingir ser maduro, para fingir outra infinidade de coisas fingidas, para continuar querendo para um dia não mais querer. Mas ainda não toca.
Quer para fingir ter e esquece que não tem. Quer, lembra que não tem e faz cara feia.
Querer é tolice, é olhar para o que não tem e gritar "eu quero, eu
quero!" Quando tem não quer mais, quer o que tinha antes, quer outra coisa e permanece a escolher o que quer, e não quer.
Não recebe de bom grado porque quer outra coisa. Faz de conta que gostou, joga fora e põe a tampa da lixeira sobre o coração de outrem. Joga fora objetos, joga fora pessoas, joga fora pessoas-objeto; joga tudo fora porque não quer, joga fora porque quer...
Tem a noite, quer o dia; tem o dia, quer a noite e volta a querer o que tinha antes e já não quer outra vez.
Apenas o ciclo de quem necessita ter algo único e pensa que quer, mas não sabe o que quer e pensa querer tudo sem se saciar, sem parar, e cada dia mais a crescer o vazio por tanto querer. Quer se saciar sem saber como.
Quanto mais quer mais amargurado fica, mais frustrado. E continua a querer, e quanto mais quer, mais sente o âmago amargar e mais sente o buraco negro a por dentro engolir e deixar apenas o vácuo.
Algo lhe falta, mas não sabe o que. É um vazio sem descrição, o porquê de tanto querer. Necessita de algo grande o bastante que não precise mais ser saciado. Mas não sabe o que é, e continua a experimentar, querer, experimentar e se destruir, se autoconsumir.
A necessidade de ter, de querer, de ter e destruir, a paisagem ao redor e a si mesmo, ao seu corpo, a sua mente e a sua alma.
Dentro do pequeno ser há um espaço mais que infinito para que seja completado por algo maior que o infinito, perfeitamente. Assim deixa de querer o pó da terra, o pó que o transcorrer do tempo leva, para querer o que suas mãos não podem tocar, para querer o que a sua mente não pode enxergar. Um separanto querer. Esperança.
Rodrigo Santos.

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